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O Teatro Moderno Brasileiro

Publié le 24/03/2015

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O TEATRO E O MODERNISMO NO BRASIL Como vocês viram no "Arquivo 2", na virada do século XIX para o XX não assimilamos as lições do teatro moderno europeu e ficamos à margem das conquistas no terreno da dramaturgia e da encenação. Podemos dizer que esse estado de coisas permaneceu inalterado até a década de 1930, lembrando que as primeiras peças teatrais modernas escritas no Brasil foram as de Oswald de Andrade, entre 1933 e 1937: O Rei da Vela, A Morta e O Homem e o Cavalo. Como essas peças não foram montadas na época, o primeiro espetáculo moderno, com texto brasileiro, aconteceu em dezembro de 1943, no Rio de Janeiro: Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, sob a direção do encenador recém-chegado da Polônia, Ziembinski. Ainda vamos falar muito dessas duas peças que vou enviar digitalizadas a vocês. Em relação ao teatro brasileiro no período do chamado pré-modernismo, podemos dizer que se deu continuidade ao teatro que se fazia no século XIX, sem qualquer ligação com as conquistas modernas ou com os movimentos da vanguarda europeia (Futurismo, Cubismo, Expressionismo, Espiritonovismo) das duas primeiras décadas do século XX. É claro que houve alguns dramaturgos que escreveram boas peças (por exemplo: O Canto sem Palavras, de Roberto Gomes, autor que admirava Maeterlinck; ou A Bela Madame Vargas, de João do Rio), mas não se conseguiu levar o teatro brasileiro a um patamar mais elevado. Avancemos em direção ao Modernismo. Vocês devem ter estudado em LB I ou LB II o Modernismo. Vocês sabem que houve uma renovação da poesia, da prosa, da pintura, da música e da escultura, por parte de artistas que se inspiraram nos movimentos da vanguarda europeia. Vocês sabem que os jovens artistas organizaram a Semana de Arte Moderna em 1922 e que o movimento modernista modificou o panorama das artes no Brasil. Menos do teatro. Pois é: não se discutiu a modernização do teatro na Semana de Arte Moderna. Como explicar isso? Leiam o que diz o historiador Sábato Magaldi no seu Panorama do Teatro Brasileiro: Reunindo anseios latentes nos mais diversos setores da nacionalidade, realizou-se em São Paulo, em 1922, a Semana de Arte Moderna, cujo objetivo era sacudir todos os campos da expressão estética, esclerosados no academicismo e na acomodação. Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Villa-Lobos, Anita Malfati e tantos outros renovaram a poesia, o romance, a música, a pintura e as demais artes, atualizando-as simultaneamente pelos padrões internacionais provenientes do Futurismo, do Cubismo e dos demais ismos europeus, e pelo mergulho nas fontes brasileiras não convencionais, a começar pela adoção de uma linguagem que se aproximava da fala popular, rompida com a rígida sintaxe lusitana. Não houve uma manifestação artística que deixasse de respirar o ar da liberdade trazido pelo movimento modernista. Infelizmente, só o teatro desconheceu o fluxo renovador, e foi a única arte ausente das comemorações da Semana. A exigência do trabalho coletivo, no espetáculo, com o concurso obrigatório de autor, intérprete e público, afastou o palco da inquietação e da pesquisa que logo lançariam no admirável nível de agora as outras artes. Não seria mesmo verossímil que a prática de uma comédia sentimental, muitas vezes rasteira e padronizada nos efeitos a alcançar sobre a platéia, se sensibilizasse com a audácia de uma pintura, que abandonava a paisagem e o retrato fotográficos, e a poesia, que expunha ao ridículo a preocupação formalista da rima rica. O mundo do teatro profissional perdeu o contato com as demais artes, nessa correspondência que é sempre vitalizadora de todas as expressões. Vejam nas últimas nove linhas as explicações de Sábato Magaldi. Arte coletiva, o teatro requer o envolvimento de artistas diversos: o dramaturgo, o encenador, o cenógrafo, o figurinista, o músico etc. Não tínhamos, na ocasião, condições para efetuar a modernização do teatro no Brasil. E vejam: nem quando Oswald escreveu suas peças. Para se ter uma ideia da nossa precariedade artística, basta dizer que não havia entre nós ainda o encenador, mas apenas o ensaiador. O encenador é um artista; o ensaiador é um técnico, que faz as marcações no palco para os artistas, mas não tem a visão de conjunto, não assina o espetáculo. Além disso, as companhias dramáticas mantinham o Ponto, outro técnico que soprava as falas para os artistas no palco, uma vez que nem todos sabiam seus papeis de cor. Enfim, todas as práticas do século XIX tinham continuidade na dramaturgia e no espetáculo. É claro que pessoas que haviam viajado à Europa ou lido revistas que tratavam de arte moderna não estavam satisfeitas com o estado do nosso teatro. Merece destaque o escritor modernista Antônio de Alcântara Machado, que escreveu bastante sobre o teatro da década de 1920, lamentando seu atraso artístico. Vou colar abaixo um trecho do capítulo "O teatro dos Escritores Modernistas", de Orna Messer Levin, publicado em História do Teatro Brasileiro, obra em dois volumes que organizei e que foi publicada em 2012 e 2013. No segundo volume, ela escreve: Em estudo pioneiro sobre a Semana de Arte Moderna, Mário da Silva Brito detectou algumas inclinações difusas na direção da modernização artística durante os anos que antecederam a festa de 19221. Ele mostrou que já havia uma consciência em relação à necessidade de renovar os processos criativos e atualizar os modelos da tradição. Contudo, as iniciativas de promoção de mudanças efetivas ainda se limitavam a manifestações individuais, isoladas e esporádicas. O impulso modernizador, é sabido, só veio a adquirir unidade e força com a organização da Semana, realizada no Teatro Municipal de São Paulo, que resultou na convergência inédita, em termos de Brasil, entre diferentes linguagens artísticas. Porém, longe de esgotar-se nos gestos demolidores da "fase heróica", como se tornou conhecida aquela investida inaugural do modernismo, o evento funcionou como um ponto de irradiação, um foco de efervescência criativa, preparando o campo para mudanças futuras, inclusive de ordem social. Ofereceu estímulo a experimentações artísticas, que continuaram a surgir nas décadas seguintes. Em uma de suas linhas de frente, o movimento acentuou as inquietações internacionalistas, como decorrência do contato direto com as vanguardas europeias do pós-guerra, as quais exerceram forte impacto sobre o pensamento conceitual no campo das artes plásticas e da literatura, embora reflexos sejam encontráveis igualmente na arquitetura, no estatuário, nas artes decorativas e, sem dúvida alguma, no teatro. Paralelamente, uma feição nacionalista proveniente da exaltação dos elementos nativos motivou os anseios de emancipação frente à influência estrangeira e demarcou caminhos diversos na busca da renovação dos mitos da nossa nacionalidade. O teatro enquanto ingrediente da nascente cultura de massas mantinha-se distante das propostas vanguardistas, pois permanecia em consonância com as exigências do esquema comercial imposto às empresas atuantes no circuito profissional. Os palcos brasileiros continuaram reproduzindo a preferência do público médio pelos gêneros de bulevar e pelos 1 Mario da Silva Brito, História do modernismo brasileiro: I Antecedentes da Semana de Arte Moderna. 2ª. ed., Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1964. exemplares remanescentes do teatro ligeiro2. Em parte, porque, dependente dos resultados da bilheteria e sem contar com subsídios permanentes, o teatro via-se diretamente afetado pelas condições econômicas estabelecidas no mercado de bens culturais. Como consequência, as artes cênicas tardaram a incorporar as proposições da Semana, que outros campos artísticos absorveram com maior rapidez. Não houve, porém, descaso dos modernistas em relação ao teatro, como se chegou a supor3. As evidências são suficientes para assegurar que a geração modernista se preocupou com os rumos da arte dramática e nela desejou interferir. Antônio de Alcântara Machado, Oswald de Andrade e Mário de Andrade redigiram artigos de opinião tratando da cena contemporânea. Veicularam ensaios de crítica, publicaram peças curtas e deixaram manuscritos em que o desejo de modificar a linguagem teatral torna óbvio o envolvimento com os palcos4. Em certa medida, foi a distância involuntária da ribalta, talvez gerada pela própria ruptura que idealizaram em relação aos espectadores e também aos artistas, o que tornou as incursões modernistas pela arte dramática um fenômeno mais literário do que teatral. Alcântara Machado Décio de Almeida Prado foi o primeiro a ressaltar a contribuição de Antônio de Alcântara Machado (1901-1935) como crítico e teórico do teatro no período de militância heroica do modernismo. O crítico enfatizou o caráter doutrinário dos escritos de Alcântara Machado, fazendo-os equivaler a um verdadeiro Prefácio a Cromwell5. Na mesma linha de redescoberta, Cecília de Lara percebeu, por trás do trabalho jornalístico dele, a sensibilidade de um homem que se confrontava, de modo cada vez mais intenso, com a complexa relação entre o exercício do crítico teatral, o trabalho do dramaturgo, a atuação dos atores e a 2 O teatro musicado, na segunda metade do século XIX, identifica um fenômeno da nascente cultura de massas, que, no Brasil, se alimentou da produção de sucessivas revistas de ano. Cf. Fernando Antonio Mencarelli, A cena aberta. A absolvição de um bilontra e o teatro de revista de Arthur Azevedo, Campinas: Ed. da Unicamp, 1999. 3 Samuel Rawet, "Teatro no modernismo: Oswald de Andrade", em José da Gama Saldanha Coelho (org.). Modernismo: estudos críticos. Rio de Janeiro, Revista Branca, 1954, p. 101-111. 4 Exemplos são os textos de Mário de Andrade, "Moral quotidiana. Tragédia (Juro que é tragédia)" em Estética, n. 2, jan./março de 1925, p.1; Sérgio Buarque de Holanda, "Antinous (fragmento) episódio quase dramático", em Klaxon, n. 4, p. 1-2; A. de Alcântara Machado, "A ceia dos convidados" em Jornal do Comércio, São Paulo, 22 de janeiro de 1927; e "O Nortista" (póstumo) divulgado por Múcio Leão em A Manhã, Suplemento "Autores de Livros", Rio de Janeiro, 16 de maio de 1943; Oswald de Andrade, "Fragmento Garcia" (título póstumo) em Sarrafo, março 2003, p. 12. 5 Décio de Almeida Prado, "O Teatro" em O Modernismo. Affonso Ávila (org.) 2ª. Edição, São Paulo: Editora Perspectiva, 2002, p. 139-151. participação da plateia. Em seus artigos Cecília de Lara encontrou uma espécie de diagnóstico inconformado daquilo que vigorava no teatro de entretenimento, assinalando a gestação de um posicionamento discordante que se acentuou rapidamente, a ponto de o escritor demonstrar grande irritação e uma atitude veemente de protesto, própria dos gestos modernistas de revolta e contestação6. Na função de crítico teatral, Alcântara Machado considerava o meio paulistano atrasado. Acusava os espectadores de falta de paladar e formação estética. Na cobertura dos espetáculos diários para o Jornal do Comércio acompanhou as montagens dos teatros Apolo, Boa Vista e Sant´Anna7. Expôs o progressivo desgaste das fórmulas praticadas pelas empresas profissionais que excursionavam no Brasil e na América do Sul. Em relação às nacionais, quase todas sediadas no Rio de Janeiro, reclamava da inexistência de novidades. Queixava-se do repertório trazido pelas bem-sucedidas trupes cariocas, como Abigail Maia e Trianon, em que prevaleciam as comédias de costumes, muito apreciadas pela plateia, mas que a seu ver estavam impregnadas pelo romantismo sentimental, que a voga sertaneja de peças talhadas na vertente regionalista, como Flores de Sombra, de Cláudio de Souza, fizeram ressurgir, e desgastadas pela "mesmice insuportável" dos tipos tradicionais. Atacava a repetição de situações e de tipos da galeria fixa em que figuravam sempre a repisada mulata, o caipira, o português enriquecido e o rapaz de comportamento afrancesado. Desagradava-lhe, sobretudo, a linguagem chula, escorregando invariavelmente para os "abomináveis exageros" próprios da farsa e da baixa comédia, cujo intuito único era, em sua opinião, oferecer um entretenimento fácil à audiência. Também considerava indignas as revistas do teatro musicado, apesar de reconhecer o sucesso que colhiam nas casas da Praça Tiradentes. Não se cansava de apontar os mesmos defeitos de sempre: Obras como essa abundam no teatro nacional. São peças que procuram fixar um momento, um aspecto característico da vida da burguesia carioca. O comediógrafo faz a caricatura de meia dúzia de tipos reais, sempre os mesmos, tendo à frente a infalível criada mulata e naturalmente pernóstica; exagera o cômico de certas cenas verdadeiras; inventa duas ou três situações de efeito hilariante; arma um entrecho tocado de uma leve ponta de sentimentalismo piegas; põe na boca dos personagens uma série de disparates, expressos numa linguagem pitoresca e estranha que se parece muito de longe com o português de Camões e de todos nós; adapta as suas figuras ao feitio e ao temperamento dos atores que devem encarnar; enche os três atos de piadas, 6 Cecília de Lara, De Pirandello a Piolim: Alcântara Machado e o Teatro no Modernismo. Rio de Janeiro: Inacem, 1987. 7 A. de Alcântara Machado registrou no Jornal do Comércio impressões sobre várias montagens, como Amigo da paz, de Armando Gonzaga (15/02/1923), A vida é sonho, de Oduvaldo Vianna (02/03/1923), Nossos papás, de Ribeiro Couto (23/03/1923), Tentação, de Amadeu Amaral (05/04/1923), 1830, de Paulo Gonçalves (19/04/1923) e A Inquilina de Botafogo, de Gastão Trojeiro (02/05/1923). de trocadilhos, de mil cousas irrisórias, e faz então a peça assim construída subir à cena, absolutamente seguro de seu êxito, e com razão, porque em verdade ele nunca falta8. Insatisfeito com a acomodação dos comediógrafos brasileiros às fórmulas da comicidade popular, tentou apontar alternativas e recomendar a criação de comédias mais sérias9. De outra parte, relacionava a precariedade do repertório à instabilidade das empresas profissionais mostrando-se reticente com relação ao oportunismo de certos empreendedores, cujo interesse financeiro considerava prejudicial à renovação da arte dramática. Sua preocupação com a constituição do mercado de trabalho para os atores aliava-se à recusa ao personalismo exagerado dos intérpretes. Censurava os gestos de vaidade pessoal dos primeiros atores, o excesso de interferência na interpretação dos textos e as rivalidades gratuitas. Num período em que os atores se especializavam em tipos - o cômico, o galã, a viúva -, Alcântara discordava da troca de papéis. Não aceitava, por exemplo, que profissionais do teatro de revista, acostumados a atuar em papéis populares, como caipiras ou mulatos, representassem tipos elegantes e de boas maneiras. Acreditava ser impossível conciliar os dois papéis num só intérprete; e por isso reivindicava coerência e bom senso na distribuição dos tipos. De modo semelhante, repreendia a atuação de atores caracteristicamente trágicos em comédias por considerar que isso criava um desajuste em cena e prejudicava a percepção da plateia. Também quando se tratava da nacionalidade dos atores entendia que o teatro deveria evitar falsificações, saindo em defesa da atuação de brasileiros nos papéis caracteristicamente nacionais. Já em relação às companhias estrangeiras, reclamava da vinda de grupos decadentes que chegavam ao Brasil com atores velhos, no final da carreira, para apresentar um repertório conhecido e sem atrativos. Seus alvos principais eram as companhias portuguesas, contra as quais se lançou em combate. Sintonizado com o viés nacionalista do Manifesto Pau Brasil, adotou uma posição de resistência às montagens do além-mar e ao padrão de representação lusitano10. No mesmo ano em que Oswald lançou o manifesto na imprensa, Alcântara

« acomodação.

Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Villa-Lobos, Anita Malfati e tantos outros renovaram a poesia, o romance, a música, a pintura e as demais artes, atualizando-as simultaneamente pelos padrões internacionais provenientes do Futurismo, do Cubismo e dos demais ismos europeus, e pelo mergulho nas fontes brasileiras não convencionais, a começar pela adoção de uma linguagem que se aproximava da fala popular, rompida com a rígida sintaxe lusitana.

Não houve uma manifestação artística que deixasse de respirar o ar da liberdade trazido pelo movimento modernista.

Infelizmente, só o teatro desconheceu o fluxo renovador, e foi a única arte ausente das comemorações da Semana.

A exigência do trabalho coletivo, no espetáculo, com o concurso obrigatório de autor, intérprete e público, afastou o palco da inquietação e da pesquisa que logo lançariam no admirável nível de agora as outras artes.

Não seria mesmo verossímil que a prática de uma comédia sentimental, muitas vezes rasteira e padronizada nos efeitos a alcançar sobre a platéia, se sensibilizasse com a audácia de uma pintura, que abandonava a paisagem e o retrato fotográficos, e a poesia, que expunha ao ridículo a preocupação formalista da rima rica.

O mundo do teatro profissional perdeu o contato com as demais artes, nessa correspondência que é sempre vitalizadora de todas as expressões.

Vejam nas últimas nove linhas as explicações de Sábato Magaldi.

Arte coletiva, o teatro requer o envolvimento de artistas diversos: o dramaturgo, o encenador, o cenógrafo, o figurinista, o músico etc.

Não tínhamos, na ocasião, condições para efetuar a modernização do teatro no Brasil.

E vejam: nem quando Oswald escreveu suas peças.

Para se ter uma ideia da nossa precariedade artística, basta dizer que não havia entre nós ainda o encenador, mas apenas o ensaiador.

O encenador é um artista; o ensaiador é um técnico, que faz as marcações no palco para os artistas, mas não tem a visão de conjunto, não assina o espetáculo.

Além disso, as companhias dramáticas mantinham o Ponto, outro técnico que soprava as falas para os artistas no palco, uma vez que nem todos sabiam seus papeis de cor.

Enfim, todas as práticas do século XIX tinham continuidade na dramaturgia e no espetáculo.

É claro que pessoas que haviam viajado à Europa ou lido revistas que tratavam de arte moderna não estavam satisfeitas com o estado do nosso teatro.

Merece destaque o escritor modernista Antônio de Alcântara Machado, que escreveu bastante sobre o teatro da década de 1920, lamentando seu atraso artístico.. »

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